© Nadir Afonso.
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A morfometria, qualidade de fonte matemática, é a essência da obra de arte, sendo ela que, numa ilusão de imanência, imprime alma nas outras qualidades próprias dos objectos: a perfeição surge-nos, assim, mais justa, a harmonia mais pura, a evocação mais sincera, a originalidade mais espontânea, como se os objectos fossem banhados de espiritualidade… quando, na realidade, apenas são reestruturados segundo aquela mesma geometria – considerada por Platão, «a beleza absoluta» – que rege as formas elementares da natureza.
E esta certeza mostra-se de tal modo evidente que, durante a nossa longa vida, sempre rebatemos as conjecturas dos estetas, críticos de arte.
Vejamos como se gera essa convicção de que não existe uma lei determinante, própria da obra de arte – «a arte é um mistério» diz Albert Einstein.
Os filósofos pensam que nunca a estética poderia constituir-se como disciplina rigorosa, nem jamais, a liberdade criadora da arte, seria submetida às regras predeterminadas da ciência e suas normas quantitativas … e, contudo, apesar de tão bem conceituados argumentos, o filosofo engana-se, esquece que na criação artística, a matemática perpassa intuitiva, conduzida por uma percepção sensível e nunca acessível a uma consciência dizível.
Para entender a noção de morfometria e alcançar o que de eterno e transmissível existe na obra de arte, reveste-se de primordial importância, cultivar, mediante uma prática perseverante, a nossa acuidade às formas da natureza e laborá-las de tal modo que possamos distinguir os atributos imutáveis próprios dos espaços e diferenciá-los dos atributos mutáveis, próprios dos objectos, sujeitos à evolução natural.
Dado que as formas elementares da natureza – círculo, esfera, quadrado, cubo, triângulo equilátero … – estão na origem dos espaços regidos por leis, é nesta essência particular da obra de arte que o filósofo-esteta sente sem, todavia perceber, o mistério que emana dos objectos convertidos a uma mensurarão quantitativa.
A operação morfométrica – essa conversão da forma do objecto em matemática da forma – é amplamente tratada nos nossos trabalhos anteriores[1].
Nunca houve entre mim e os homens políticos, um bom acolhimento como se receasse, confiar-lhes o meu modo de sentir. Reconheço, contudo, que o estudo do materialismo histórico de Marx assim como da teoria do reflexo de Lenine (1870-1924), pela clareza dos seus ensinamentos e pela atenção que lhes devotei, muito me evitaram os erros da sua própria estética.
Se bem que o nosso trabalho esteja fundado sobre o trabalho destes homens e consideramos o seu sentido da evolução, inultrapassável, é, contudo, fácil de compreender a razão por que estamos em completo desacordo com as suas teorias estéticas: elas carecem, a nosso ver, desse outro sentido das geometrias matemáticas imutáveis, essência da obra de Arte. Os seus estudos «Sobre Arte»[1] surgem, assim, decapitados à nascença.
Aragon (1897-1982) não poderia ter explicado melhor as suas próprias carências: «Não pensem que sou um comunista sem sensibilidade para ver a Arte Abstracta, mas … não vejo possibilidade de aproximar os termos da política militante comunista e a Arte Abstracta»[2].
E, porque é que, Aragon, não vê aproximação possível? Não vê, porque a Arte Abstracta é justamente essa morfometria intuitiva, essa essência única que, pelas suas leis imutáveis, escapa não só ao marxismo mas a toda a filosofia, hoje, fundada sobre a evolução natural.
E se tal conceito evolucionista, incentivo duma proliferação de sucessivas performances de vanguarda, de mensagens “artísticas” — políticas ou esotéricas — e seus consagrados disparates, se consente, isso se deve ao facto de que a presença das leis constante da Natureza e da Arte, sempre os ditos «geométricos obcecados», a sentiram e preservaram.
Nadir Afonso, extraído do livro «As Artes: Erradas Crenças e Falsas Críticas»
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